CASA FERREIRINHA '85, '86, '96 E '97
Não temos uma resposta incondicional para o fenómeno, mas a verdade é que o Inverno nos impele para a prova de vinhos com alguma idade. O frio do época poderia, é certo, aconselhar exactamente o oposto, ou seja a escolha de vinhos jovens, encorpados, cuja força, exuberância e álcool aquecessem os "espaços em volta", mas não. Decididamente, a nossa escolha tem seguido inteira para vinhos, normalmente tintos, moldados pelo tempo, vinhos com fôlego e com a subtil complexidade que só o tempo em garrafa atribui. Talvez seja afinal a Quadra Natalícia, e a inerente vontade de provar o que de melhor temos na garrafeira, que nos leva a cometer esse devaneio de abrir algumas daquelas preciosas garrafas que reservamos para uma ocasião especial. Talvez...
Este ano, regressámos à "Casa Ferreirinha" (Sogrape), um dos poucos produtores nacionais que, a par de vinhos de volume, se especializou em tintos que sabem e conseguem envelhecer de forma nobre. Este ano, regressámos a duas colheitas dos anos '80 e a outras duas da década de '90. De uma assentada, provámos - e adorámos todos eles – o Barca Velha (T) 1985, o Ferreirinha Reserva Especial (T) 1986, o Ferreirinha Reserva (T) 1996 e o Ferreirinha Reserva Especial (T) 1997. Incrível, desde logo, o facto de todos os vinhos estarem em perfeitas condições, ou seja, sem oxidações excessivas, sem cheiro a "rolha", com níveis adequados de líquido, com as rolhas firmes, todos com viva cor encarnada e todos (uns mais do que outros) com fruta ainda evidente.
Nos vinhos da década de '80, o Barca Velha (T) 1985 mostrou-se altivo, com uma cor impressionante para os seus vetustos 25 anos (próxima da tonalidade exibida pelo Reserva de 1996, onze anos mais novo...), um nariz clássico elegantíssimo onde notas a caça mortificada e fruta encarnada se moldam em harmonia até um final perfeito, fino mas longo (17-17,5). Ainda melhor que o anterior, o Reserva Especial (T) 1986 revelou-se um hino aos vinhos com evolução em garrafa: perfeito na fruta que enche o "bouquet", ainda irreverente, com enorme elegância mas também vigoroso, referências a mina de lápis e tabaco num fundo ainda nítido de frutas como cereja e groselha encarnadas; final perfeito, em crescendo, impressionante a vários títulos (17,5-18).
Depois, foi a vez dos dois vinhos da década de '90, necessariamente mais "novos", mas ambos a revelar a marca do produtor e do nome que ostentam. O Reserva (T) 1996 em bom nível, macio e aveludado, notas positivas de evolução mas ligeiramente mais linear (e menos fresco) que os restantes provados (16,5-17) e, por isso, aconselha-se bebê-lo nos próximos anos. Já o Reserva Especial (T) 1997 mostra-se com taninos saborosos, com vigor, especiado e com frescura, ainda com bom nervo, boca com complexidade em alta e final elegante. Pode ainda ser guardado mais uns anos na garrafeira (17-17,5).
Em suma, quatro grandes vinhos e a uma certeza: a de que a Casa Ferreirinha tem vinhos que sabem, efectivamente, envelhecer nobremente. É claro que sempre ficam algumas interrogações: será que a década que se aproxima nos vai trazer mais tintos destes? Daqui a 10 anos, como estará o Reserva Especial (T) 2001 recentemente lançado no mercado? Independentemente das respostas a estas (e outras) questões, certo é que todos os vinhos provados estavam óptimos e recomendam-se, merecendo destaque absoluto o Reserva Especial (T) 1986, um vinho que, com 24 anos, se mantém um gigante com "pernas para andar" na garrafeira e que, nessa medida, pode ainda ser guardado mais uns anos, sempre para os momentos especiais da vida - se poderia ter sido Barca Velha(?), talvez... mas isso, a nosso ver, não interessa nada.
Boas Festas e Feliz 2010!